sexta-feira, 11 de junho de 2010

'Dibicando' pipas...


A vida é um grande campo. Verde, sereno, iluminado, onde venta um vento leve e constante.
No campo encontram-se pessoas... muitas pessoas! Sozinhas, silenciosas e com olhar fixo no acontece no firmamento. Nas suas mãos, um fio. Um fio de linha, extenso e delicado que liga cada uma a sua pipa: rebolante ou não, longínqua ou próxima, colorida ou apagada, mas pipa!
Essas pessoas solitariamente 'dibicam' e movimentam seu brinquedo de acordo com as possibilidades impostas pelos ventos: o externo, aquele que não podemos controlar, e o interno, aquele que tanto insistem que controlemos. Assim, elas ficam lá.. dibicando. Sempre sozinhas, sempre... só elas!
As vezes as pipas se aproximam umas das outras e um ruido tenso e silencioso se estabelece. O encontrar de pipas pode ser perigoso. O simples toque pode deixar marcas profundas e definitivas em cada uma. Os encontros, mesmo antes de ocorrerem, assustam e nem sempre são evitáveis. Pelo contrário! Ao expor sua pipa, o dono, inevitavelmente, a coloca no limite do individual e do coletivo e esse limite é tão tênue que há quem afirme que ele não exista. O silêncio e a solidão acontecem em meio ao berro social em que se encerra o campo.
Vez ou outra, vê-se uma pipa sem paradeiro, estanque, indo... indo...
Acabou seu tempo de 'dibiques' e firulas. Ela se foi e nesse momento um silêncio mortal, mas genuino, significa a grande dúvida dos que permanecem a dibicar: para onde?
Olhar a pipa indo embora é aterrorizante, mas todos são obrigados a fazê-lo, pois os que se recusam tornam-se tão fixos em suas próprias pipas que parecem zumbis perdidos numa estrada de luz: embora iluminada, não sabem para que servem, para eles, ela não faz sentido.
E assim, solitariamente, permanecem todos a 'dibicar', traçando contornos e retornos condicionados, em última análise, pelo tempo, ele mesmo: o cronos devorador de pipas!

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Pus o meu sonho num navio


Não é meu não, é da Cecília (a Meireles, por favor)mas é como se meu fosse...


Pus o meu sonho num navio
e o navio em cima do mar;
- depois, abri o mar com as mãos,
para o meu sonho naufragar

Minhas mãos ainda estão molhadas
do azul das ondas entreabertas,
e a cor que escorre de meus dedos
colore as areias desertas.

O vento vem vindo de longe,
a noite se curva de frio;
debaixo da água vai morrendo
meu sonho, dentro de um navio...

Chorarei quanto for preciso,
para fazer com que o mar cresça,
e o meu navio chegue ao fundo
e o meu sonho desapareça.

Depois, tudo estará perfeito;
praia lisa, águas ordenadas,
meus olhos secos como pedras
e as minhas duas mãos quebradas.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

forças


Alguma coisa brota em mim que me faz ser, segundo todos querem que eu acredite, demoníaco. É isso mesmo! DEMONÍACO com todas as letras garrafais e aquelas bocas de heavy metal de batom preto e linguão de piercing pra fora. Grotesco? Pode ser sim, mas real.

Paremos para pensar um pouco. Uma vida libertária de fato, no meu ver, segue dois caminhos, ao mesmo tempo: o do respeito ao próximo e a si mesmo. É o mesmo princípio cristão do amai ao próximo etc etc etc. O que ninguém quer parar para pensar é o que amar a si mesmo pode significar.

A origem da palavra demoníaco desemboca em dois sentidos que são antagônicos, talvez não em termos sincrônicos, mas no que se propõem a serem. O nefasto, o esquerdo, o cambrolhão está ligado á idéia de diabólico. Esse me assusta! Esse pode me tirar daquele caminho do respeito ao próximo, e por consequência, da minha liberdade humanitária. O outro, é ele mesmo, o demoníaco que está ligado exatamente àquelas forças de TNT que nos impulsionam, nos fazem impulsivos, e fazem com que nos sintamos mais vivos. Traduzindo é a libido: o tesão, a vontade de dançar, de beber, de xingar a quinta geração de vizinhos, de botar fogo no rabo do gato e de mandar aquela velha professora pra ponte que partiu em Barra de São João! Também é a força que me faz amar. Amar até as últimas consequências. Com demonstrações sinceras de carinho, com choros, escândalos e silêncios. Pode até ser aquela força que no suicídio nos faz ter a falsa ilusão de que ali a vida continua. Enfim, é o moinho, o gerador, o ponta pé, o tapa na bunda que faz o bebê perceber que por aqui não cabe ficar engasgado.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

filhos


Ai como eles falam...
Meu Deus, como eles falam...
Acho legal o exercício hiperbólico de vocativos: "pai, por que ele ganhou três e eu não, pai? Hein, pai? por que ele ganhou três pai? Por que pai? Me diz pai"

Paitai kai pai rai! Quanto pai!

Ai como eles se mexem...
Meu Deus, como eles se mexem...
Gosto das habilidades malabarísticas e mágicas de esconder-se e surgir: lição 1)escalando porta com o dedo pronto para ser esmagado, lição 2) ficando debruço na janela faminta para engolir criança até o estômago do térreo e lição 3) fazendo cabanas com apenas 2 vassoras e 5 lençois limpos.

Como diria Lady Kate: 'Jesus Crime'

Estranha compatibilidade entre paz e caos...
Compatibilidade estranha entre seres marcados pelo desgaste da vida e criaturas virgens de maldade.

Ouvi dizer que são eles, os filhos, os únicos a falar a verdade... talvez seja por isso que nós os amemos tanto.